Ai!... que me deu um faniquito quando eu li essa notícia aí embaixo!
Entidade do movimento negro faz protesto em frente ao SPFWEducafro quer cota de modelos negros duas vezes maior que a atual, de 10%
Beatriz Souza
A Educafro – Educação e Cidadania de Afro-descendentes e Carentes, rede de cursinhos pré-vestibulares comunitários, está promovendo um protesto diante do Pavilhão da Bienal, no parque Ibirapuera, em São Paulo, na tarde desta segunda-feira. O protesto, iniciado às 16h30, é dirigido ao São Paulo Fashion Week, que tem início nesta segunda, no local. Com faixas e cartazes, cerca de 20 pessoas pedem uma maior participação duas vezes maior de negros nas passarelas.
"Fashion Week, presta atenção, o povo negro não quer mais enrolação", grita o grupo. A reivindicação é para que os estilistas aumentem de 10% para 20% a participação de modelos pretos. "A Educafro, em busca da igualdade racial (...), acredita que é inaceitável essa padronização europeia nos desfiles de moda no Brasil", diz texto colocado no site da organização.
"Quando lutamos para que fosse instituída uma cota de 10% de negros nos desfiles, inaugurada em 2007, nós imaginamos que os organizadores continuariam esse trabalho de inclusão. Queremos mais negros nas passarelas", diz Frei Davi Santos, diretor-executivo da Educafro e líder do protesto. "Fazer um desfile como se estivéssemos na Suíça é um atentado para o Brasil. Se o SPFW não aumentar a cota sozinha, vamos procurar o Ministério Público e ir à Justiça pedindo não 20%, mas logo 30%."
Alguma coisa ainda sem explicação, aqui dentro de mim, já me incomodava em relação às sempre polêmicas cotas para negros nos diversos setores da sociedade. Daí, no dia das mães ganhei um livro que namorava há tempos: o Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil de Leandro Narloch.
O livro é uma provocação, uma pequena coletânea de pesquisas históricas sérias que vão diretamente contra a historiografia politicamente correta, derrubando mitos populares sobre heróis e episódios marcantes do país, prestando um grande serviço ao pensamento crítico.
Resumindo: o que ganhei não foi apenas um livro, ganhei argumentos para aquela inquietação inicial...
Isso porque descobri que era comum africanos ou descendentes escravizarem e que estudos recentes demonstraram uma mudança no ponto de vista: os negros deixaram de ser vistos como vítimas constantemente passivas, que nunca agiam por escolha própria. Os historiadores buscaram mostrar o negro como sujeito da história, protagonista da escravidão, ainda que não aquilombado. Tais estudos fizeram aflorar histórias aparentememte desagradáveis para minorias e movimentos sociais, como estas:
Zumbi tinha escravos
É na data de morte do maior herói negro do país que muitas cidades do país comemoram o Dia da Consciência Negra. O que poucos sabem é o fato de que ele mandava capturar escravos de fazendas vizinhas para que trabalhassem forçados no Quilombo dos Palmares. Talvez esta informação ofenda algumas pessoas hoje em dia, a ponto de preferirem omití-la ou censurá-la, mas na verdade trata-se de um dado óbvio - na sua época não havia nada de errado nisso. Zumbi viveu no século 17 e quem viveu nessa época tinha escravos, sobretudo se liderasse algum povo de influência africana.
Até o século 19, povos negros invadiam povos vizinhos para capturar gente. Recrutavam garotos, que depois transformavam em guerreiros e adultos para trocar por ferramentas e armas com os europeus. Essa prática fez desses povos grandes fornecedores de escravos para a América. Os quilombolas não fugiam à regra: faziam pequenos ataques à povoados próximos. Aqueles que chegavam ao quilombo"por sua própria conta" eram considerados livres, já aqueles que eram raptados ou trazidos à força das vilas vizinhas continuavam escravos.
O que houve, na verdade, foi um esforço em caracterizar Palmares como a primeira luta de classes na História do Brasil. Os livros que falam sobre Palmares não são confiáveis e há indícios de que as fontes foram inventadas e tais histórias constam até hoje no Livro dos Heróis da Pátria da presidência da República.
O sonho dos escravos era ter escravos
Assim que conseguiam comprar a alforria, o próximo passo de muitas mulheres negras livres do século 18 era adquirir escravos para si próprias. Em liberdade, essas Chicas da Silva tinham muito mais tempo e ferramentas para ganhar dinheiro. Contando com escravos como mão de obra barata, algumas fizeram fortuna.
A angola Isabel Pinheira morreu em 1741 deixando sete escravos no testamento, que deveriam ser todos alforriados quando ela morresse. Na década de 1760 a baiana Bárbara de Oliveira tinha vários imóveis, jóias, roupas de seda e nada menos que 22 escravos, que era uma fortuna para a época (uma carta de alforria custava cerca de 150 mil réis - o equivalente a uma casa simples na cidade).
Outro caso interessante é o da negra Bárbara Gomes de Abreu e Lima, dona de um casarão em frente à Igreja Matriz de Sabará, ela tinha sete escravos e parcerias comerciais com empresários e políticos. O fato dela ter escravos não era novidade: em 1830 os negros somavam 3/4 da população livre e 43% das casas de negros livres tinham escravos. O que as estatísticas mostram é que comprar gente era um ato corriqueiro de quem subia de vida, tanto entre brancos como entre negros e que ter sido escravo dificultava, mas não impedia essa ascensão.
A angola Isabel Pinheira morreu em 1741 deixando sete escravos no testamento, que deveriam ser todos alforriados quando ela morresse. Na década de 1760 a baiana Bárbara de Oliveira tinha vários imóveis, jóias, roupas de seda e nada menos que 22 escravos, que era uma fortuna para a época (uma carta de alforria custava cerca de 150 mil réis - o equivalente a uma casa simples na cidade).
Carta de Alforria |
"(...)Os brasileiros livres de cor não eram, definitivamente, um grupo isolado ou marginalizado, sem acesso aos recursos da economia aberta de mercado. Uma parcela volumosa desse grupo já experimentava considerável mobilidade econômica, e participava da maioria das ocupações e arranjos domésticos desfrutados por seus companheiros brancos."
Também houve casos de escravos que se tornaram traficantes: voltaram para a terra natal, formando uma comunidade de brasileiros que passaram a vender gente.
Os portugueses aprenderam com os africanos a comprar escravos
Entre a diversidade de culturas africanas, a escravidão funcionava como um traço comum. As caravanas de comércio escravo existiam muitos séculos antes de os europeus atingirem a costa oeste do continente. No século 8, logo após a colonização árabe do norte da África, africanos do sul do Saara passaram a atravessar o deserto para vender aos árabes algodão, ouro, marfim e sobretudo escravos.
"A escravidão já era fundamental para a ordem social, política e econômica de partes da savana setentrional, da Etiópia e da costa oriental africana havia vários séculos antes de 1600. A escravização era uma atividade organizada, sancionada pela lei e pelo costume.Os cativos eram a principal mercadoria do comércio, incluindo o setor de exportação, eram importantes na esfera interna, não apenas como concubinas, criados, soldados e administradores, mas também como trabalhadores comuns."
Com a venda de escravos alguns reinos africanos viraram impérios. Em outras regiões, a escravidão era uma cultura estabelecida com tanta força que os camponeses pagavam impostos ao Estado central usando escravos como moeda. Para conseguir comprar ouro nesta região os portugueses precisaram arranjar escravos como moeda de troca. Estima-se que, entre 1500 e 1535, eles compraram cerca de 10 mil cativos no golfo do Benin apenas para trocá-los por ouro na própria África. Entraram em contato com os costumes locais e se tornaram escravistas.
Os africanos lutaram contra o fim da escravidão
Os nobres africanos dependiam da venda de escravos para manter seu poder. Vendendo gente eles obtinham armas e garantiam assim a expansão do território e do domínio das terras já conquistadas. Sem a troca de escravos por armas, tinham a soberania do território e a própria cabeça ameaçadas.
O ideal de liberdade dos negros, que todas as pessoas sensatas defendem hoje em dia, surgiu somente por causa dos protestos eufóricos e do poder autoritário dos ingleses e seu movimento abolicionista, cuja origem foi muito mais ideológica que econômica.
Se a Inglaterra conseguiu acabar com o tráfico pelo Atlântico, a escravidão durou muito mais em outros pontos da África. Em Serra Leoa os escravos só foram libertados em 1928 e apenas em 1950 no Sudão.
Em 2007, completaram-se duzentos anos da proibição do tráfico de escravos. A primeira vitória da campanha abolicionista da Inglaterra. Nenhum país da África ou movimento negro da América prestou homenagens ou agradecimentos aos ingleses.
Serááá??? |
Quando os escravos tinham olhos azuis
Hoje em dia relacionamos negros a escravos porque a escravidão africana foi a última - houve um tempo em que os escravos lembravam brancos de olhos azuis.
A própria palava "escravo" vem de "eslavos", os povos do leste europeu constantemente submetidos à vontade de germanos e bizantinos na alta Idade Média. Brancos europeus também foram escravizados por africanos. Entre 1500 e 1800 os reinos árabes do norte da África capturaram de 1 a 1,25 milhões de escravos brancos, a maioria deles do litoral do Mediterrâneo.
Termino transcrevendo outro trecho. Este, para mim resume bem toda essa problemática:
"Não há motivo para ativistas do movimento negro facharem os olhos aos escravos que viraram senhores. Ninguém hoje deve ser responsabilizado pelo que os antepassados distantes fizeram séculos atrás. Além disso, na época em que eles viveram, ter escravos não era considerado errado: tratava-se de um costume tido como correto pela lei e pela tradição. Negras forras e ricas podem até ser consideradas heroínas do movimento negro, personagens que ativistas deveriam divulgar com esforço. Para um brasileiro descendente de africanos, é muito mais gratificante, (além de correto) imaginar que seus ancestrais talvez não tenham sido apenas vítimas que sofreram caladas. Tratar os negros apenas como vítimas indefesas, como afirmou o historiador Manolo Florentino, 'dificulta o processo de identificação social das nossas crianças com aquela figura que está sendo maltratada o tempo todo, sempre faminta, maltrapilha'. É uma pena que historiadores comprometidos com a causa negra ou patrocinados por estatais escondam estes personagens".
Leandro Narloch |
E você, o que acha???