sexta-feira, 20 de maio de 2011

Designers são de Marte, Costureiras são de Vênus



Putz!

Qual será o problema das costureiras?

A cada novo projeto de desenvolvimento de produto eu me faço essa pergunta. 

Primeiramente, porque é mais fácil encontrar piolho em peruca do que uma costureira que confeccione uma roupa [a maioria só quer fazer ajustes].

Segundamente (rs!) quando enfim encontramos, ela só trabalha com malha [será por causa da rima?] e sendo inimigas declaradas dos tecidos planos, a gente que quer ser designer de moda fica no meio desse tiroteio. E sobra bala perdida.

Daí você encontra uma bendita. E eis que começa o sermão a aula:

Que a gente desenha sem conhecer, que se o curso é de moda a gente já devia saber isso, aquilo e aquilo outro, que a gente tem muita teoria mas que quem saaaabe mesmo é ela, que  "isso aí que a gente desenhou" não existe, que ela conhece um estilista óóótemo, que tem uma amiga que costura mal pra caramba e outra que faz alta costura (Oohhhhhhh!!!)


 Impáfia!

Pausa para uma fungada.  


Costureiras no divã. Esta profissão não é a mais antiga do mundo, mas está no Top 10. 

Até o século XVII, o status de costureira era considerado modesto, de modo que só eram "autorizadas" a fazer consertos e ajustes para alfaiates e camiseiros.  Nessa época, somente os mestres alfaiates tinham legitimidade para vestir homens e mulheres. Porém, algumas possuíam em sigilo uma rede de clientes.

As costureiras que não seguissem as regras eram perseguidas, recebiam multas e tinham seus materiais apreendidos. Somente em 1675, por ordem do Rei Luís XIV, adquiriram reconhecimento e parte do "mercado". Entretanto, eram proibidas de manter em suas lojas quaisquer peças de tecido ou de comercializá-las.

Haviam quatro categorias: a costureira de vestuário, a costureira de roupas infantis, a costureira de camisaria e a costureira de acabamentos.

Em 1782, foi concedido o direito de rivalizar com os alfaiates na confecção de corpetes, espartilhos e crinolinas, assim como de robes masculinos e dominós de baile. A partir de então, algumas de tornaram famosas e, entre as que ficaram para a posteridade, podemos citar Rose Bertin na época de Luis XVI, Madame Palmyre na de Carlos X, Mademoiselle Beaudrant na de Luís-Felipe, entre outras.

Por maior que fosse a notoriedade das costureiras, a autonomia e poder de atuação permaneceram restritos por algum tempo.


Até que CABRUM! Explode o Prèt-à-porter. Produções artesanais e autorais perdem espaço [snif!...] para aquelas fabricadas em série, impulsionando ainda mais a Revolução Industrial.

Foi dado início a uma grande padronização da costura e o trabalho das costureiras, em um primeiro momento, foi desvalorizado. 


Novos focos e critérios de criação impuseram-se; a configuração hierarquizada e 
unitária precedente rompeu-se; a significação social e individual da moda mudou-se 
ao mesmo tempo que os gostos e os comportamentos dos sexos. 
(Lipovetsky,p.107,1989)

Posteriormente, os burgueses, na busca pelo "diferente", começaram a contratar costureiras para que suas roupas fossem mais elegantes e distintas.

Adiante, a costureira, ora figura central no processo de criação de produtos de moda, cede lugar ao estilista (e mais adiante ao designer). O modo de produção artesanal não refletia mais um tempo em que a moda pretendia tornar-se democrática.

Hoje, a indústria da moda incorporou parte das profissionais da costura, outra parte encontrou no trabalho exclusivo e sob medida um motivo para continuar se orgulhando de sua sina profissão. Entretanto, o número das que se interessaram em atualizar-se ou em incorporar essa multidisciplinariedade exigida pelo mercado ainda é pouco expressivo. 

Talvez, o conjunto de tooodos esses fatores tenha dado causa à origem de algum ressentimento, descontado em nós a cada visita em seus ateliers.

Cartas na mesa, eu gostaria que entendessem o seguinte:

Primeiramente, que estamos num curso de Bacharelado em Design de Moda, nem técnico, nem de corte e costura. O bacharel é um pesquisador por excelência. É sabido que precisamos conhecer a fundo todas as etapas do processo e buscamos isso. Talvez, se nos recebessem com mais simpatia, haveria maior empatia e uma enorme troca de experiências, o que faria a teoria aprendida no curso fazer muito mais sentido.
Afinal, costureiras um dia também precisaram aprender com alguém.

Segundamente (rs!) que não sou estilista. Nem designer sou ainda. Mas uma coisa que eu aprendi na faculdade e na vida é que pra emitir opinião sobre algo eu devo primeiro conhecer aquilo de que estou falando. Conhecendo, falo com propriedade, posso até não concordar, mas tenho argumentos. 

Porque, cá entre nós: comprar a ideia de que alguém faz alta costura, aqui do ladin de casa, não dá, né?

E por último: vocês costureiras são essenciais! São especiais! Imprescindíveis!...


...fadas que transformam nosso sonho de papel em roupas de verdade.


Nós não competimos: somos aliadas!

Penso que, talvez, todo esse orgulho esconda no fundo um sentimento de desvalorização ou de inferioridade - o que não se justifica, dada sua importância no processo de confecção e a relevância de seu trabalho para a sociedade.

Portanto, proponho:

Vamos aprender juntas! Do respeito vem o crescimento, novas parcerias, quem sabe. Se nós, futuros designers vencermos vocês vencerão conosco.

O nosso sucesso é o vosso sucesso.






FONTE: GRUMBACH, Didier. Histórias da Moda. São Paulo: Cosac Naify, 2009. p.15.